Os Donos dos Rios

 

 

Num mundo onde a água já escasseia, há muito que os rios deixaram de ser coutada privada dos construtores de mega-barragens.

 

Criadores de vida, os rios têm vindo a merecer progressiva atenção e, hoje em dia, raros são os casos em que se toleram estratégias mono-centradas em hidro-electricidade.

 

Infelizmente, este nível de consciência pública só pôde ser atingido à custa de vários desatinos ambientais - e muitos desastres socio-económicos.

 

De certo modo, Cahora-Bassa é exemplo de ambos.

Não só porque se transformou num pesadelo financeiro, mas sobretudo porque, durante décadas, ao invés de valor, Cahora-Bassa apenas trouxe danos ao Rio Zambeze.

 

A guerra a criou ... a guerra a sufocou.

 

Recorde-se que a albufeira começou ser cheia a 5 Dezembro 1974, numa simples estação de chuvas (1974-75) e sem qualquer compensação de fluxos. Apenas 60 m3/s fluíam então - como fugas.

 

Incidentalmente, em Março 1975, e durante 5 dias, os construtores foram forçados a uma descarga de emergência por forma a prevenir-se o galgamento da inacabada barragem. Mais de 1.27 biliões de metros cúbicos de água foram vomitados para a zona distributária do Zambeze via descargas que atingiram 14 753 m3/s.

 

Vinte anos depois, a barragem de Cahora-Bassa produzia pouco mais que 20 MW ( um por cento da potência nominal), e os fluxos de descarga mantinham-se constantes - 758 m3/s. Uma constância que muitos rotulam de catastrófica.

 

Durante duas décadas a barragem operou como uma anomalia permanente no continuum do rio e, em 1996, logo que a paz o permitiu, o reconhecimento aéreo do Zambeze evidenciava claramente o impacto de negligentes administrações - de água, e de hidro-electricidade, entre outras.

 

Desde então, pouca coisa mudou.

A administração de águas no Rio Zambeze continua a ser ditada pelo economicismo dos interesses hidro-eléctricos, e pouca gente presta atenção ao desgaste das zonas distributárias do rio e à rotura sistémica da costa. As próprias cheias nem sempre merecem a devida atenção.

 

Sucede que, neste longo entretanto, o governo moçambicano terá despendido mais de 10 milhões USD no marketing hidroeléctrico do Zambeze - primeiro com Cahora-Bassa fase 2, e mais recentemente com Mphanda Nkuwa.

 

E, independentemente da confusão e pasmo que as contradições entre todos estes estudos suscitam, há uma simples coisa que não percebo:

 

porque não se faz

o que preconizam todos estes caríssimos estudos?

 

 

E passo a seleccionar extractos do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) elaborado pelos consultores da projectada barragem de Mphanda Nkuwa:

 

"uma decisão quanto à descarga de fluxos ambientais (freshets) deverá ser baseada em objectivos claros, e definidos em termos de benefícios económicos, sociais e ecológicos...

 

... aparentemente, as reivindicações visando a alocação multi-uso das águas do Zambeze são objecto de crescente favor por parte do politicamente descentralizado sistema político em Moçambique.

 

embora isto não faça parte do âmbito do presente projecto (estudo de viabilidade), propõe-se que o GoM (Governo de Moçambique) encomende um programa de pesquisa adaptável que identifique o fluxo ambiental preferido para o baixo Zambeze.

 

dado o limitado entendimento que (hoje) existe quanto às condições no Baixo Zambeze e, considerando a falta de capacidade técnica e financeira de Moçambique para realizar este trabalho (definição de melhor cenário), o processo de planeamento do projecto (Mphanda Nkuwa) poderá correr o risco de vir a depender de pesquisa básica e de modelação previsional, tal como proposto pela Comissão Mundial de Barragens (2000).

O que será dispendioso, para além de arrastado. A validação do modelo preferido requererá tempo, e provar-se-á custosa.

 

Em alternativa, recomenda-se uma aproximação mais prática. Uma alternativa mais balanceada vis-à-vis as escolhas das partes envolvidas ... e para com uma pesquisa adaptável - ao invés de um design teórico.

 

A alternativa envolve os seguintes estágios:

 

1. identificação da situação.

2. identificação dos potenciais benefícios para as partes envolvidas.

3. descargas experimentais em Cahora-Bassa durante vários anos.

4. pesquisa adaptável, através de feedback das partes envolvidas, controle técnico e avaliação dos resultados das descargas (ecológicos, e socio-económicos) e,

5. redesenho das descargas.

 

Fim de citação do EIA (Feasibility Study) relativo a Mphanda Nkuwa.Elaborado pela joint venture: Lahmeyer International (Germany), Knight-Piésold (UK) e EDF (França). E que custou a Moçambique vários milhões USD.

 

 

Ora, se tudo isto são "dogmas", como refere o Snr. Ministro, então custaram-nos muito tempo e dinheiro público.

 

josé lopes

 

dezembro 2003

 

a EDM acaba de anunciar um concurso público para a reabilitação dos sistemas hdráulicos e hidro-mecânicos da barragem da Chicamba (sistema SHER).

 

emocionado, xitizap apresenta as suas felicitações à EDM por este primeiro passo.

EDM e um presente de Natal

 

Cahora-Bassa retrospective, 1974 - 1997:

 

Effects of flow regulation on the Lower Zambezi River

 

Davies, Beilfuss & Martin

xitizap # 9

a invasão dos smelters

evasões em Kyoto?

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