Tudo somado, esta é uma maioria de 90% de urbanos que, atónita, se questiona quanto ao desenfreado exibicionismo do motor - em Maputo


Maputo, uma cidade em que a desorganizada adopção de um horário único apenas veio agravar a improdutividade das elites, a poluição e o esbanjamento energético. E os seus dramáticos problemas de transporte - que vão do insuportável número de acidentes à falta de manutenção básica das rodovias. Ou da indecência do trânsito, ao desproporcionado esforço que vai esvaindo os despojados


E se eles - despojados - não se levantarem, então a situação tornar-se-á incontrolável - pra não dizer irrecuperável


mas como em tantas outras cidades, em Maputo os despojados têm uma agenda simples

E minimalista - em termos de trânsito


uma agenda que começa por exigir a adopção de um survival package - tentativamente estruturante (seja lá o que isso signifique). Um pacote onde se incluem medidas clássicas - como a reserva de direitos de passagem, e a dignificação do Transporte Público. Um package que comece a devolver aos citadinos o primado sobre o império do motor


Entretanto note-se que em Maputo a frota de potentes automóveis, jeeps e pick-ups 4x4 apresenta uma intrigante distorção. Em particular se repararmos no produto citadino bruto, e compararmos com o de urbes vizinhas, tendencialmente próximas (estatisticamente)


aliás, basta analisar os racios de cilindrada urbana per capita - e a sua esfuziante evolução

Porque estes são racios que se engasgam com o exibicionismo dos picos de ponta - 4 ou 6 vezes por dia, e com um tesão que só pode ser de buzina

Altura em que esses carros e jipões, intrigantemente quasi-sempre vazios, vão à parada dos cavalitos - usualmente alinhados em esquadrilhas corporativas por doador, empresa, banco, ministério ou repartição


e nem mesmo Freud perceberia porque insistem eles em engalfinhar-se nos mesmo sítios - bares, esquinas e cruzamentos. E sempre com o celular na boca


Mas, para que tudo isto aconteça, só poderá haver uma razão


alguém anda a subsidiar paradas motorizadas



curiosamente


tudo indica que sejam os tesouros públicos - do Estado, e dos doadores internacionais

E esta  é uma distorção tanto mais difícil de entender quanto estes são estados que não conseguem melhorar a transitabilidade das pessoas - ou sequer das ruas para os automóveis que compram


maputo 2010

xitizap # 3    maio 2003



a cidade e o transporte público



em Maputo 2003

o transporte público urbano é uma outra bomba ao retardador


isto porque a mega Maputo se vai tornando cada vez mais num espaço (des)urbano onde só impera o automóvel - potente, macho (?), 4x4. TOP de gama sobretudo


um espaço onde se espezinha os que não o têm - uma maioria enxotada para o indizível conforto dos chapas. Ou que, a pé, calcorreia valas, fossas e buracos ... os ex-passeios públicos




E o que é mais grave é que o síndrome kompressor class poderá agravar-se

e aceleradamente. Porque ninguém duvida que os carros e carrões continuem sempre aí à mão nos frenéticos stands, ou no contrabando


Belos e disponíveis - mas só para quem não os paga com dinheiro próprio. Os tais que pouco se importam em comprar veículos de $ 20,000 a preços Ferrari. E que nem sequer se ralam com os 17 ou 25 ou 36 litros aos 100 do combustível que gastam - se calhar porque financiado pelos mesmos tesouros


Sucede que, nestes interstícios das motorizadas elites, as evidencias sugerem que os não-motorizados são 90% dos citadinos


e porque este modelo motor-centrista não serve, tudo indica que seja hora para visionar um novo conceito de Transporte Público - público, não no sentido de posse, mas no sentido de desígnio


um conceito que privilegie as óbvias rentabilidades do transporte público. E que tenha em conta, por exemplo, que uma faixa automóvel poderá servir 2,000 passageiros por hora, no limite. Versus os 60,000 da tracção eléctrica a uma fracção do custo energético


um conceito que, ao invés da situação actual, racionalize a cooperação entre os vários modos de transporte. Numa matriz em que se usam metros de superfície em rotas de elevada densidade (pessoas e mercadorias) na cintura peri-urbana - e com decente segurança. E em que autocarros e trolley-buses servem rotas intra-urbanas entregando passageiros a plataformas locais - aos chapix (um híbrido de chapas e taxis)



leia maputo 2010 - a dream city ?